Dr. Lais Marques da Silva,
ex-Custódio e Presidente da JUNAAB
Os depoimentos feitos pelos alcoólicos nos grupos de A.A. freqüentemente mostram que o alcoólico na ativa procurava ter o controle absoluto sobre os seus sentimentos e sobre o seu ambiente. Na chamada “fase ativa”, bebiam para relaxar, para ficarem “altos”, para ficar espirituosos, para abrandar a dor – para controlar. Mas, no mundo real, as coisas não são bem assim e a verdade é que o nosso ânimo depende, em boa medida, das situações e até de pessoas que estão fora do nosso controle. Bebiam também para negar esta dependência.
Ao usar o álcool, procuravam negar a limitação da vontade e a dependência e, aí, esta se tornava absoluta. Procuravam o controle ilimitado e a negação da dependência. Mas, existir como ser humano, significa ser limitado e não há absolutos nem ilimitados no nosso poder.
O A.A. mostra que somos tanto parcialmente dependentes como capazes de ter um controle, que é apenas parcial. Mostra, também, que a verdade é que o ser humano está sempre ajoelhado, a meio caminho entre estar de pé e de estar deitado.
A Irmandade de AA sugere: “Levante-se com as suas pernas, pois você pode fazer algumas coisas, mas não todas as coisas”. O A.A., por outro lado, modera a tendência para a grandiosidade dizendo: “Ajoelhe-se, você pode fazer algumas coisas, mas não todas as coisas”.
Há um jogo de “pode”, “não pode” que é sintetizado, magistralmente, na Oração da Serenidade: ”Concedei-nos Senhor a Serenidade para aceitar as coisas que não podemos modificar (não pode), coragem para modificar aquelas que podemos (pode) e sabedoria para distinguir umas das outras”. Ela retrata a condição humana em relação ao “pode” e “não pode” e mostra o caminho para esse reconhecimento a partir do qual a paz e a serenidade de espírito são alcançadas.
O alcoólico “na ativa” é uma pessoa que “tem” que beber, mas que “não pode” beber. Mais tarde, na Programação, o alcoólico percebe que não abre mão da “liberdade de beber ”mas que ganha a “liberdade de não beber” e compreende que o alcoólico não é uma pessoa que “não pode beber” mas sim uma pessoa que “pode não beber”, que dispõe de um novo poder, o de não beber. É preciso aceitar o paradoxo para poder apreciar de modo mais amplo a natureza humana e esse jogo do “pode”, “não pode”, de importância fundamental para alcançar a serenidade, ajuda a perceber e a compreender toda a dimensão de grandeza contida na Oração da Serenidade.
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